Princípios Institutivos e Informativos do Processo

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Última Atualização 6 de junho de 2025

Princípios Institutivos do Processo

Os princípios institutivos do processo são pilares que estruturam e legitimam a existência do processo jurisdicional, constituindo verdadeiros requisitos democráticos de validade do procedimento judicial. Dentre esses princípios, destacam-se o contraditório, a ampla defesa e a isonomia processual.

1. Contraditório

O contraditório é mais que um direito de informação: é a garantia de participação efetiva dos sujeitos processuais. Ele possui uma estrutura que envolve cinco elementos: informação, reação, diálogo, influência e consideração. Isso significa que as partes têm direito não apenas de saber o que se passa (informação), mas também de reagir, dialogar e influenciar o julgador antes que uma decisão seja tomada.

O art. 9º e o art. 10 do CPC reforçam essa dimensão, vedando decisões sem prévia oitiva da parte contrária ou sem possibilitar manifestação sobre fundamentos relevantes. Assim, contraditório é o “referente lógico-jurídico do processo coinstitucionalizante”, no dizer de Leal, traduzindo a dialogicidade necessária entre as partes, ainda que incluía a liberdade de permanecer em silêncio.

Aroldo Plínio Gonçalves defende que o contraditório é a garantia de participação em simetria pelas partes que suportarão os efeitos do provimento jurisdicional. A omissão, portanto, transforma o contraditório em um ônus processual: o direito de ser ouvido é também um dever de se manifestar, dentro dos prazos legais.

O contraditório é caracterizado como um princípio fundante do processo democrático porque assegura a participação efetiva das partes no desenvolvimento do processo, refletindo os valores do Estado Democrático de Direito. Ele não é apenas um direito de ser ouvido, mas um direito de influência real sobre a formação da decisão judicial.

Elementos que caracterizam o contraditório como princípio fundante

  • Participação ativa das partes: Garante que todas as partes tenham ciência dos atos processuais e possam se manifestar sobre eles. Isso preserva a igualdade de tratamento e evita decisões unilaterais ou arbitrárias.
  • Direito de influência: Como destaca a doutrina contemporânea (notadamente Luiz Guilherme Marinoni), o contraditório não é apenas o direito de falar, mas de influenciar a formação do convencimento do juiz.
  • Instrumento de legitimação da decisão judicial: O contraditório confere legitimidade às decisões proferidas, pois o juiz deve fundamentar sua decisão levando em conta as alegações e provas produzidas pelas partes. Decidir sem ouvir as partes é incompatível com o processo democrático.
  • Ligação com outros princípios constitucionais:O contraditório está ligado à ampla defesa, ao devido processo legal e à isonomia. É uma manifestação prática da democracia procedimental.
  • Caráter normativo-constitucional: Está expressamente previsto no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, o que reforça sua natureza institutiva e seu papel estruturante.

O contraditório se manifesta nos artigos 9º e 10 do Código de Processo Civil de 2015 como uma garantia fundamental do processo democrático, assegurando às partes o direito de participar efetivamente da formação da decisão judicial.

O artigo 9º estabelece que não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. Isso consagra o princípio da não-surpresa, impedindo que decisões sejam tomadas sem que a parte afetada tenha a oportunidade de se manifestar. Embora existam exceções previstas no parágrafo único desse artigo (como a concessão de tutela provisória de urgência ou de evidência, e casos de improcedência liminar do pedido), a regra geral é que toda decisão deve ser antecedida pela oitiva das partes.

O artigo 10, por sua vez, reforça o contraditório substancial ao dispor que o juiz não pode decidir com base em fundamento sobre o qual não tenha dado às partes a oportunidade de se manifestar, mesmo que se trate de matéria de ordem pública e que possa ser conhecida de ofício. Isso significa que o contraditório não se limita aos fatos trazidos pelas partes, mas se estende também aos fundamentos jurídicos que possam influenciar o julgamento.

Portanto, os artigos 9º e 10 traduzem o contraditório como direito de ciência e reação, mas também de influência real no processo, exigindo que a decisão judicial seja construída com a participação efetiva das partes.

É possível haver contraditório postergado, também chamado de diferido ou posticipado, em situações excepcionais previstas na legislação processual. Embora o contraditório seja um princípio fundamental que assegura a participação prévia das partes na formação da decisão judicial, a lei admite que, em determinados casos, a oitiva da parte contrária possa ser realizada posteriormente, com o objetivo de garantir a efetividade da tutela jurisdicional e proteger direitos relevantes.

Essa modalidade de contraditório ocorre, por exemplo, nas tutelas provisórias de urgência concedidas sem ouvir a parte contrária, quando há risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Nesses casos, a lei permite a concessão da medida “inaudita altera parte”, assegurando, contudo, que o contraditório será oportunizado em momento posterior, para que a parte prejudicada possa se manifestar. Situações semelhantes ocorrem na tutela provisória da evidência, quando se combate abuso do direito de defesa ou intuito protelatório da parte adversa, permitindo a concessão da tutela sem prévia oitiva, seguida da manifestação posterior da parte.

Além disso, o contraditório diferido pode ser aplicado na hipótese de improcedência liminar do pedido, quando o juiz reconhece, desde logo, a manifesta improcedência com base em jurisprudência consolidada, julgando o mérito sem ouvir o réu, que terá o direito de se manifestar em momento posterior, geralmente por meio de recurso. Também é admitido em medidas de caráter sigiloso, como busca e apreensão, sequestro e quebra de sigilo, nas quais a oitiva prévia poderia comprometer a eficácia da medida.

Assim, o contraditório postergado configura uma exceção justificada pelo princípio da proporcionalidade e pela necessidade de resguardar bens jurídicos relevantes, desde que a parte contrária seja posteriormente ouvida, garantindo a preservação da ampla defesa e do devido processo legal. Portanto, embora o contraditório prévio seja a regra, a lei admite sua postergação em situações excepcionais, sempre com controle judicial e possibilidade de revisão futura.

2. Ampla Defesa

Prevista no art. 5º, inciso LV da CRFB/88, a ampla defesa complementa o contraditório ao assegurar que a parte possa se manifestar de forma plena, utilizando todos os meios legais e probatórios disponíveis para sustentar sua posição.

Segundo Eduardo Couture, a ampla defesa corresponde ao direito do réu de se opor à ação (exceção), em um paralelismo civilizado ao direito de agir do autor. Assim, se a ação é o substitutivo da vingança, a defesa é o substitutivo da resistência.

A ampla defesa não é ilimitada: ela se dá dentro dos limites temporais e formais do processo. Leal adverte que não se pode, em nome da celeridade ou efetividade, sacrificar o tempo necessário à reflexão e à produção de provas, sob pena de tornar ineficaz a própria defesa.

A amplitude da defesa não implica que a parte possa produzir indefinidamente suas alegações e provas a qualquer tempo no processo. Ela deve se manifestar dentro dos meios e elementos jurídicos previstos e respeitando os prazos processuais estabelecidos em lei. A defesa deve ser ampla no sentido de não ser restringida ou comprimida de forma exagerada, especialmente em processos sumários, a ponto de tolher a liberdade da parte para refletir com calma e apresentar seus argumentos e provas de maneira eficaz.

Isso porque o tempo para a ampla defesa é essencial para que as partes possam esgotar suas possibilidades de argumentação e produção de prova, garantindo um julgamento justo. Assim, sob o pretexto de acelerar o processo ou buscar sua maior efetividade, não se deve sacrificar a garantia do tempo necessário para a ampla defesa, evitando prejuízos causados por um Estado jurisdicional já defasado ou inviável.

Em suma, a ampla defesa deve ser garantida em sua plenitude, mas dentro de limites razoáveis e legais, de modo a conciliar o direito à defesa com a eficiência e a celeridade do processo.

Afirma-se que a ampla defesa se exerce dentro dos limites do contraditório porque ambos são princípios jurídicos complementares e interdependentes que garantem a participação efetiva das partes no processo. O contraditório assegura que nenhuma decisão seja tomada sem que a parte tenha a oportunidade de ser previamente informada e de se manifestar sobre os argumentos e provas apresentados contra ela. Já a ampla defesa é o direito da parte de utilizar todos os meios e recursos legais para se defender plenamente.

No entanto, essa defesa ampla não é absoluta ou ilimitada, pois deve ocorrer dentro do tempo e das condições processuais oportunizadas pelo contraditório. Ou seja, a ampla defesa se realiza no ambiente do contraditório, que estrutura o espaço e o momento em que as partes podem se manifestar e produzir provas. Sem o contraditório, a ampla defesa perderia sua efetividade, pois não haveria garantia de participação equilibrada e simétrica no processo.

Portanto, a ampla defesa se exerce dentro dos limites do contraditório porque este define o procedimento, o tempo e as condições para que a defesa seja apresentada, garantindo que o processo seja justo e respeite o direito fundamental à participação e à manifestação das partes.

Crítica ao modelo dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95): Ao prever apenas registros resumidos dos atos essenciais e permitir a destruição das gravações após o trânsito em julgado, o sistema dos JECs compromete a fiscalidade e a transparência do processo, prejudicando a compreensão dos fundamentos da decisão e, consequentemente, a capacidade de impugnação da parte.

3. Isonomia Processual

A isonomia é um princípio constitucional (art. 5º, caput, CRFB/88) que se projeta no âmbito processual como a paridade de armas (parità delle armi). Segundo o art. 7º do CPC, cabe ao juiz assegurar às partes tratamento igual em todas as fases do processo, inclusive quanto ao exercício de faculdades, meios de defesa e sanções. A expressão “paridade de armas” significa que, no processo judicial, todas as partes envolvidas devem ter iguais condições de se defender, apresentar provas, argumentos e exercer seus direitos processuais. Esse conceito está ligado à ideia de isonomia processual, garantindo que nenhuma das partes tenha vantagem ou desvantagem injusta durante o andamento do processo. Em outras palavras, “paridade de armas” assegura que o combate jurídico ocorra em condições equilibradas, promovendo um julgamento justo e imparcial.

A isonomia processual implica igualdade de oportunidades, o que não significa tratamento idêntico, mas sim equilíbrio real no jogo processual. Leal afirma que é indispensável à efetivação do contraditório, pois não há liberdade de contradizer sem igualdade de tempo e meios para dizer e contradizer.

Calmon de Passos destaca que a igualdade é um ideal a ser constantemente buscado: as diferenças naturais e sociais entre os indivíduos exigem um esforço permanente de humanização para mitigar os efeitos dissociadores dessas desigualdades. Assim, a isonomia processual é uma forma de concretizar esse ideal no espaço do processo.

Cassio Scarpinella Bueno sintetiza bem o conteúdo da isonomia processual: o juiz deve garantir iguais chances às partes durante todo o procedimento, ouvindo-as com igualdade de oportunidades em todas as fases processuais.

A isonomia processual e a igualdade formal do caput do art. 5º da Constituição Federal possuem conexões, mas se distinguem em seus conceitos e aplicações.

A igualdade formal prevista no caput do art. 5º da CF estabelece que todos são iguais perante a lei, sem qualquer distinção, assegurando um tratamento igualitário básico em termos jurídicos e sociais. É um princípio geral que visa garantir que ninguém sofra discriminação arbitrária.

Já a isonomia processual se refere à igualdade efetiva no âmbito do processo judicial, especialmente na relação entre as partes. Ela não se limita a uma igualdade abstrata ou formal, mas busca assegurar a paridade argumentativa e procedimental, ou seja, que todas as partes tenham iguais oportunidades para exercer seus direitos processuais, apresentar suas provas, alegações e se manifestar durante todo o desenvolvimento do processo.

Enquanto a igualdade formal é um ideal constitucional amplo e geral, a isonomia processual é um princípio técnico-jurídico específico do direito processual, que garante a “paridade de armas” no processo, permitindo que nenhuma parte esteja em desvantagem prática em relação à outra.

Assim, a isonomia processual transcende a igualdade formal ao promover uma igualdade concreta e funcional, garantindo um processo justo e equilibrado, respeitando a simetria na participação dos sujeitos processuais.

A atuação do juiz é fundamental para garantir a isonomia entre as partes no processo. Isso porque o juiz deve zelar para que todos tenham igual tratamento no exercício dos direitos e faculdades processuais, assegurando que nenhum lado tenha vantagem indevida ou seja prejudicado durante o procedimento.

O juiz atua como um árbitro imparcial que deve:

  • Proporcionar igualdade de oportunidades para manifestação, produção de provas e argumentação;
  • Assegurar que as partes tenham acesso aos mesmos meios de defesa e recursos processuais;
  • Evitar abusos, desrespeitos ou desequilíbrios que comprometam a paridade no processo.

Assim, a isonomia processual depende diretamente do papel ativo e vigilante do juiz, que deve garantir o equilíbrio do conflito, promovendo um julgamento justo e respeitando os princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e igualdade.

Conclusão

Os princípios institutivos do processo (contraditório, ampla defesa e isonomia) são interdependentes e estruturam o processo como espaço democrático de decisão. Sua violação compromete a legitimidade da atividade jurisdicional, e sua efetiva observância é condição de possibilidade para um processo justo, transparente e constitucionalmente adequado.

Os princípios informativos do processo são normas de base que orientam o funcionamento do procedimento jurisdicional em sua forma e estrutura prática. Diferem-se dos princípios institutivos do processo, pois não instituem o processo como categoria normativa essencial, mas sim o conformam no plano lógico-operativo. Como destaca Rosemiro Pereira Leal, os princípios informativos não devem ser confundidos com os princípios gerais do direito processual, uma vez que estes são mais amplos e estruturantes, enquanto os informativos funcionam como variáveis lógico-jurídicas dos princípios institutivos (LEAL, 2018, p. 169).

Princípios Informativos do Processo

Dentre os principais princípios informativos, destacam-se: oralidade, publicidade, lealdade processual, disponibilidade e indisponibilidade, economia processual, celeridade processual e instrumentalidade das formas.

1. Princípio da Oralidade

A oralidade é princípio fundamental que marca a forma de condução de atos processuais. Conforme Eduardo Couture, ela se opõe ao princípio da escritura e se configura nos sistemas em que os atos processuais se realizam de viva voz, especialmente em audiência, reduzindo os escritos ao estritamente necessário (COUTURE, 1974, p. 199).

Contudo, como ensina Chiovenda, é difícil conceber um processo exclusivamente oral. O que há nos sistemas modernos é um processo misto, sendo ele qualificado como oral ou escrito conforme o espaço atribuído a cada forma, especialmente quanto à forma como a oralidade se expressa (CHIOVENDA, 2009, p. 1003).

É fundamental ainda distinguir o princípio da oralidade das técnicas de oralidade. Como observa Dhenis Cruz Madeira, as técnicas de argumentação oral (por exemplo, em audiências) são variadas, mas todas se submetem ao princípio da oralidade, que lhes dá sustentação. A técnica é instrumento; o princípio é fundamento (MADEIRA, 2014, p. 207-253).

O princípio da oralidade consiste na realização dos atos processuais, principalmente das manifestações das partes e das decisões do juiz, por meio da fala, de forma direta e imediata, geralmente em audiências públicas. Ele valoriza a comunicação oral viva como instrumento fundamental para a transparência, dinamismo e efetividade do processo.

Na prática forense, a oralidade se concretiza principalmente por meio de:

  • Audiências, onde as partes, testemunhas e peritos falam diretamente perante o juiz;
  • Sustentação oral dos advogados para defender seus argumentos;
  • Interações orais entre magistrado, partes e demais envolvidos, promovendo um diálogo direto e instantâneo.

Embora a oralidade seja o princípio predominante, ela não exclui o uso da escrita, que permanece necessária para a formalização dos atos e registro documental. Dessa forma, o processo moderno é misto, combinando oralidade e escrita, mas dando primazia à comunicação oral como meio essencial para garantir a ampla defesa, o contraditório e a efetividade da prestação jurisdicional.

2. Princípio da Publicidade

A publicidade assegura que os atos processuais e julgamentos sejam, por regra, públicos e acessíveis, salvo exceções constitucionalmente admitidas, como quando se trata da defesa da intimidade ou do interesse social (CRFB, art. 5º, LX; art. 93, IX).

A vinculação desse princípio à ampla defesa é evidente: ele permite o controle social do processo e o acesso de terceiros, garantindo a compreensão das decisões por todos os interessados. Segundo Leal (2018, p. 170), a publicidade está logicamente aderida à ampla defesa, e representa um fundamento democrático do processo. A eventual restrição desse princípio se justifica apenas pela prevalência de outros princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana.

A publicidade dos atos processuais pode ser limitada em situações específicas previstas em lei. Embora o princípio da publicidade assegure que os atos do processo sejam públicos, garantindo transparência e controle social, essa publicidade pode ser restringida para proteger interesses superiores, como a intimidade, a privacidade das partes e o interesse social.

As principais hipóteses em que a publicidade pode ser limitada são:

  • Segredo de Justiça: Quando a divulgação dos atos processuais puder causar dano à intimidade, à segurança ou à ordem pública, o juiz pode determinar que o processo tramite em segredo de justiça, restringindo o acesso apenas às partes, seus advogados e interessados legais.
  • Proteção de interesses de menores ou vulneráveis: Em casos que envolvam crianças, adolescentes ou pessoas vulneráveis, para preservar seus direitos e dignidade, pode-se limitar a publicidade.
  • Questões de segurança pública ou interesse social relevante: Quando a divulgação ampla dos atos puder comprometer a ordem pública, a segurança do Estado ou outros interesses sociais importantes.

Assim, a limitação da publicidade é exceção que se justifica por princípios constitucionais maiores, como o direito à intimidade, à dignidade da pessoa humana e à segurança, devendo ser aplicada com critérios rigorosos para não comprometer a transparência e o controle do Poder Judiciário.

A publicidade dos atos processuais está diretamente relacionada à garantia da ampla defesa, pois ambas asseguram a transparência e a possibilidade de pleno exercício dos direitos processuais pelas partes.

O princípio da publicidade permite que os atos do processo sejam conhecidos não apenas pelas partes envolvidas, mas também por terceiros interessados e pela sociedade, garantindo controle e fiscalização sobre a atuação do Poder Judiciário. Isso reforça a legitimidade do processo e previne abusos.

Já a ampla defesa assegura que toda parte tenha a oportunidade de apresentar suas alegações, produzir provas, impugnar atos e influenciar o convencimento do julgador.

A relação entre os dois princípios se dá porque a visibilidade do processo é essencial para que a parte saiba exatamente o que está sendo discutido, o que foi decidido e quais elementos foram produzidos no curso da demanda. Essa transparência é condição necessária para que a defesa seja exercida de forma plena e efetiva.

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Além disso, a publicidade permite que a própria sociedade fiscalize a imparcialidade e a legalidade das decisões judiciais, o que também contribui para um ambiente processual mais justo e equilibrado.

3. Princípio da Lealdade Processual

A lealdade processual impõe um dever jurídico de boa-fé e respeito mútuo entre os sujeitos do processo. Trata-se de um dever (e não faculdade), e está diretamente relacionado à isonomia processual. Sua violação pode acarretar sanções processuais, como multa por litigância de má-fé, anulação de atos, responsabilização penal ou disciplinar.

Leal adverte que o princípio da lealdade não se confunde com uma noção moral subjetiva de virtude, mas consiste em um dever objetivo de comportamento sério e honesto, sem utilização fraudulenta do processo para fins ilícitos (LEAL, 2018, p. 171).

Esse dever também se aplica ao juiz. Márcio Faria (2017, p. 413) aponta que o uso abusivo da jurisdição, sob o “fetiche da celeridade”, compromete a lealdade do julgador. Modelos decisórios preconcebidos, desinteresse real na demanda e formalismos excessivos constituem práticas desleais da atividade jurisdicional.

O princípio da lealdade processual caracteriza-se pelo dever de as partes, advogados, juízes e demais sujeitos do processo agirem com honestidade, boa-fé e correção durante toda a tramitação da demanda. Esse princípio impõe a obrigação de que todos se comportem de forma leal, sem utilizar o processo como meio de enganar, surpreender ou prejudicar a parte contrária por meio de condutas fraudulentas, dolosas ou abusivas.

A natureza jurídica da lealdade processual é de dever legal, e não mera faculdade ou expectativa moral. Trata-se de um princípio de conteúdo ético-jurídico que decorre do próprio Estado Democrático de Direito e da garantia do devido processo legal. Seu descumprimento pode acarretar sanções como:

  • multa por litigância de má-fé (arts. 79 a 81 do CPC),
  • anulação de atos processuais praticados com deslealdade,
  • responsabilização penal ou disciplinar (quando aplicável).

A lealdade processual também está diretamente relacionada ao princípio da isonomia, pois busca assegurar que o processo transcorra em ambiente de equilíbrio, respeito e paridade entre as partes. Assim, impede-se que uma das partes obtenha vantagem indevida por comportamentos oportunistas ou desonestos.

O descumprimento do princípio da lealdade processual pode gerar diversas consequências jurídicas, de natureza processual, civil, penal e disciplinar, conforme a gravidade da conduta e o sujeito envolvido. Dentre as principais consequências, destacam-se:

  1. Multa por litigância de má-fé: Prevista nos arts. 79 a 81 do Código de Processo Civil (CPC), aplica-se à parte que age com deslealdade, altera a verdade dos fatos, usa o processo para fim ilícito, provoca incidentes infundados ou interpõe recurso com intuito manifestamente protelatório.
  2. Anulação de atos processuais: Os atos praticados com violação à lealdade podem ser considerados nulos, especialmente se causarem prejuízo à parte contrária ou violarem garantias do devido processo legal.
  3. Responsabilização civil: A parte que agir com deslealdade poderá ser responsabilizada a indenizar a outra por danos materiais e morais causados por sua conduta no curso do processo.
  4. Responsabilização penal: Em certos casos, a conduta desleal pode configurar crime, como falso testemunho, fraude processual, denunciação caluniosa, entre outros, o que poderá ensejar ação penal.
  5. Sanções disciplinares: Advogados, membros do Ministério Público, magistrados e demais sujeitos submetidos a deveres funcionais podem ser responsabilizados disciplinarmente por atos desleais, nos termos dos respectivos estatutos ou leis de regência (como o Estatuto da OAB, a LOMAN etc.).

Portanto, a violação à lealdade processual compromete não apenas a higidez do processo, mas também a integridade do sistema de justiça, razão pela qual suas consequências são severas e plurais.

4. Princípios da Disponibilidade e Indisponibilidade

Esses princípios se relacionam com o objeto do processo e a natureza dos direitos discutidos:

  • Disponibilidade: típica do processo civil, permite às partes dispor de seus direitos, decidir sobre o ajuizamento, desistência ou acordo.
  • Indisponibilidade: própria do processo penal ou de ações que envolvam direitos fundamentais indisponíveis, como o interesse público ou de incapazes.

Segundo Leal (2018, p. 171-2), o chamado “princípio da disponibilidade processual” não diz respeito ao procedimento em si, mas sim à faculdade de o titular do direito postular ou não. Já o direito de ação é indisponível: ninguém pode ser privado da faculdade de buscar o Judiciário, nem mesmo no campo penal (vide ação penal subsidiária da pública na omissão do MP, art. 5º, LIX, CF).

Os princípios da disponibilidade e da indisponibilidade processual se distinguem com base na natureza do bem jurídico discutido e na atuação das partes no processo.

O princípio da disponibilidade aplica-se, em regra, aos direitos patrimoniais privados, que podem ser livremente administrados por seus titulares. Nesses casos, as partes têm liberdade para dispor do direito material, podendo, por exemplo, ajuizar ou não uma ação, desistir, fazer acordo, transigir ou renunciar ao direito pleiteado. Isso é típico do processo civil, quando se trata de direitos disponíveis, como obrigações contratuais, propriedade, danos morais e materiais, entre outros.

Já o princípio da indisponibilidade rege os processos que envolvem direitos indisponíveis, geralmente de interesse público ou social, como ocorre no processo penal (em regra), no direito de família, no direito da criança e do adolescente, e em ações civis públicas. Nesses casos, o titular do direito não pode renunciar, transigir ou dispor livremente do objeto litigioso. Assim, a atuação do Ministério Público, por exemplo, é necessária ou obrigatória, e a jurisdição deve ser exercida mesmo contra a vontade das partes.

Em síntese:

  • Disponibilidade: parte tem poder de disposição sobre o direito material; aplica-se a direitos disponíveis.
  • Indisponibilidade: parte não pode dispor do direito; aplica-se a direitos indisponíveis, protegidos pelo Estado ou com forte interesse público envolvido.

Esses princípios influenciam diretamente o modelo procedimental, as formas de composição e a intervenção estatal nos processos.

5. Princípio da Economia Processual

Esse princípio propõe que os atos processuais sejam realizados da maneira mais eficiente e econômica possível, sem prejudicar o exercício dos direitos das partes, especialmente o contraditório e a ampla defesa. Economia processual não significa apenas redução de custos ou tempo, mas preservação da efetividade e utilidade do processo, evitando repetições inúteis, sem comprometer os princípios institutivos.

O princípio da economia processual tem como fundamentos centrais a eficiência, a racionalidade e a utilidade da atividade jurisdicional. Seu objetivo é garantir que o processo seja conduzido de forma a evitar atos inúteis, repetitivos ou excessivamente dispendiosos, desde que não haja prejuízo às garantias fundamentais do contraditório e da ampla defesa.

Os principais fundamentos desse princípio são:

  1. Efetividade da jurisdição: busca-se alcançar a tutela jurisdicional de forma mais rápida, simples e econômica, sem comprometer a qualidade ou a justiça da decisão.
  2. Proporcionalidade entre meios e fins: o processo deve empregar os meios necessários e adequados para atingir o fim pretendido (a resolução justa do conflito), evitando formalismos excessivos ou etapas desnecessárias.
  3. Aproveitamento dos atos processuais: sempre que possível, os atos processuais devem ser aproveitados, mesmo que praticados com alguma irregularidade formal, desde que não haja prejuízo às partes (princípio da instrumentalidade das formas).
  4. Redução de custos e tempo: o processo deve evitar dispêndios desnecessários, tanto financeiros quanto temporais, buscando uma tramitação célere e com menor custo para o Estado e para os jurisdicionados.
  5. Prestação jurisdicional adequada: economia não significa precariedade; a redução de atos ou formalidades deve ser feita sem afetar os direitos fundamentais das partes, garantindo o equilíbrio entre celeridade e justiça.

Assim, o princípio da economia processual é um instrumento de eficiência a serviço da justiça, que deve ser interpretado em harmonia com os demais princípios constitucionais do processo, especialmente a dignidade da pessoa humana, o contraditório e a ampla defesa.

6. Princípio da Celeridade Processual

A celeridade é exigência expressa da Constituição (art. 5º, LXXVIII, CRFB/88) e deve ser garantida sem prejuízo à ampla defesa. Seu objetivo é impedir a morosidade injustificada e assegurar o tempo razoável de duração do processo. Entretanto, como alerta Faria (2017), a celeridade não pode justificar a supressão de garantias fundamentais como a lealdade ou o contraditório. A busca por maior eficiência não deve comprometer a legitimidade da prestação jurisdicional.

A citação de Márcio Carvalho Faria critica duramente a obsessão pela celeridade processual quando ela se descola dos valores fundamentais do processo justo. Ao falar em “fetiche da celeridade” e eficiência perniciosa ou quantitativa, o autor denuncia uma lógica que prioriza números e produtividade em detrimento da cooperação processual, da escuta efetiva e da lealdade no exercício da jurisdição.

Nesse contexto, o autor aponta que práticas como a adoção de modelos decisórios padronizados (sem atenção ao caso concreto), o desinteresse real do juiz pela demanda e o rigor excessivo com formalidades não são apenas falhas técnicas, mas violações à lealdade processual. A jurisdição, nesses moldes, torna-se abusiva porque compromete os princípios da isonomia, do contraditório e da ampla defesa.

Portanto, o texto reforça que celeridade não pode ser um fim em si mesma, mas deve ser buscada em harmonia com os demais princípios processuais, sobretudo a lealdade, a cooperação e o respeito às partes. A atividade jurisdicional deve ser séria, comprometida e sensível à complexidade da demanda, e não pautada por metas estatísticas ou automatismos que anulam o devido processo legal.

7. Princípio da Instrumentalidade das Formas

Esse princípio reconhece que o processo é instrumento da jurisdição, e que a forma dos atos não é um fim em si mesma. O ato processual, enquanto ato jurídico, deve obedecer à forma legal quando houver previsão específica; caso contrário, a forma é relativa e funcional. Assim, a inobservância da forma só acarreta nulidade se causar prejuízo à parte, conforme a regra da “pas de nullité sans grief”. O foco não está na forma pela forma, mas no resultado e na garantia das partes. A máxima “pas de nullité sans grief”, de origem francesa, significa “não há nulidade sem prejuízo”. No contexto processual, essa expressão consagra a ideia de que um ato processual só deve ser anulado se tiver causado efetivo prejuízo à parte. Ou seja, falhas formais ou erros procedimentais não justificam, por si sós, a invalidação de um ato, a menos que se demonstre que comprometeram o exercício do contraditório, da ampla defesa ou de outro direito processual relevante.

Esse princípio reforça a instrumentalidade das formas, segundo a qual a forma serve como meio para atingir os fins do processo, e não como um fim em si mesma. Portanto, busca-se evitar decisões inúteis ou formalistas que prejudiquem a celeridade e a efetividade da prestação jurisdicional.

O princípio da instrumentalidade das formas consiste na ideia de que a forma dos atos processuais não é um fim em si mesma, mas um meio para alcançar os objetivos do processo, especialmente a efetiva tutela jurisdicional com respeito ao contraditório e à ampla defesa.

Segundo esse princípio, eventuais irregularidades formais não devem levar à nulidade do ato processual se o resultado pretendido foi atingido e não houve prejuízo para as partes. Essa ideia é consagrada no brocardo latino “pas de nullité sans grief”, que significa que não há nulidade sem prejuízo.

A jurisprudência admite o aproveitamento de atos processuais mesmo diante de erro de forma quando não houver prejuízo às partes e os fins do ato tiverem sido alcançados, em consonância com os princípios da instrumentalidade das formas e da máxima “pas de nullité sans grief”.

As principais hipóteses são:

  1. Inversão na ordem de oitiva das testemunhas: se ambas as partes foram ouvidas e o contraditório foi respeitado, o ato é considerado válido.
  2. Erro na indicação do fundamento legal: quando o pedido ou decisão é corretamente compreendido, ainda que o fundamento jurídico esteja incorreto.
  3. Citação com erro formal, mas com ciência inequívoca: se a parte foi citada de forma irregular, mas compareceu aos autos e exerceu seu direito de defesa, o ato é convalidado.
  4. Intimação feita de forma diversa da prevista em lei, mas efetiva: se a parte teve ciência e pôde se manifestar, o ato é aproveitado.
  5. Inobservância de formalidade em recurso interposto: quando, apesar da forma incorreta, é possível identificar a intenção recursal, o ato pode ser regularizado.

Nessas hipóteses, prevalece o princípio da finalidade do ato: se o objetivo da norma foi atendido, o erro formal não gera nulidade.

Desse modo, a função prática do princípio é evitar decisões inúteis e retrabalhos processuais por meras falhas formais, quando não comprometerem direitos essenciais ou a função do ato. A instrumentalidade das formas valoriza a substância sobre a forma, promovendo maior eficiência, economia e justiça no processo.

Conclusão

Os princípios informativos do processo atuam como vetores pragmáticos do direito processual. A oralidade, a publicidade, a lealdade processual, a disponibilidade ou indisponibilidade, a economia, a celeridade e a instrumentalidade das formas moldam a dinâmica procedimental, sem jamais comprometer os pilares do contraditório, da ampla defesa e da isonomia. Compreender sua função requer não apenas leitura dogmática, mas análise crítica sobre como esses princípios são (ou não são) respeitados na prática jurisdicional.

Diferença entre princípios institutivos e princípios informativos:

Princípios institutivos são aqueles que fundamentam e legitimam o processo como instituição jurídica. São estruturais, fundantes e possuem natureza constitucional. Ex.: contraditório, ampla defesa, isonomia, devido processo legal.

Princípios informativos, por sua vez, são aqueles que orientam a prática processual e a conformação do procedimento. São diretrizes de estrutura e funcionamento do processo. Ex.: oralidade, publicidade, lealdade processual, economia processual.

Relação entre princípios institutivos e informativos:

Os princípios informativos se subordinam aos princípios institutivos. Isso significa que os princípios informativos servem como instrumentos de realização dos princípios institutivos. Em outras palavras, são meios pelos quais os princípios institutivos se concretizam no plano prático do processo.

Exemplo: a oralidade (princípio informativo) é uma forma de garantir a ampla defesa (princípio institutivo); a publicidade (informativo) assegura a transparência exigida pelo devido processo legal (institutivo).

Fundamentação doutrinária:

Rosemiro Pereira Leal afirma que os princípios informativos são variáveis lógico-jurídicas dos princípios institutivos e que não devem ser confundidos com os princípios gerais do direito processual, pois estes são mais amplos. Há, portanto, distinção conceitual, mas interdependência funcional.