Última Atualização 11 de maio de 2025
O Poder Judiciário não pode ser utilizado como instrumento de intimidação ou retaliação contra o exercício legítimo da liberdade de expressão. Essa preocupação ganhou contornos mais definidos com o reconhecimento da figura do assédio judicial (sham litigation), especialmente em situações nas quais se multiplicam ações judiciais idênticas, movidas em diferentes comarcas, com o objetivo de constranger, silenciar ou inviabilizar a defesa de jornalistas, comunicadores ou figuras públicas. O Supremo Tribunal Federal já reconheceu a gravidade dessa prática, estabelecendo diretrizes que protegem o réu vítima de assédio, como a possibilidade de reunião das ações no foro do seu domicílio e a responsabilização civil do autor das demandas abusivas. Nesse contexto, a jurisprudência e a doutrina vêm consolidando o entendimento de que, configurado o assédio judicial, os danos coletivos são presumidos (in re ipsa), e a responsabilidade do autor das ações intimidatórias pode ser objetiva, sobretudo quando se comprova o desvio do direito de ação para fins ilícitos.
FGV (2025):
QUESTÃO CERTA: Flúvio, comediante, incluiu em seu show uma piada sobre personagem sacro. Um líder dessa religião concita todos os advogados que professavam a mesma fé a ajuizar, nos juizados especiais de cada comarca, demanda indenizatória contra esse comediante. O Ministério Público Federal, ao identificar o assédio processual (sham litigation), aciona esse líder religioso em ação civil pública buscando, além da cessação da prática ilícita, indenização pelos danos causados, notadamente à liberdade de expressão.
Nesse caso, é correto afirmar que: a responsabilidade do líder religioso será objetiva; e os danos coletivos, objeto do pedido, in re ipsa.
< em>“1. Ações diretas de inconstitucionalidade contra dispositivos do Código Civil, do Código de Processo Civil e da Lei nº 9.099/1995, com o objetivo de que lhes seja conferida interpretação conforme a Constituição para assegurar a proteção à liberdade de expressão diante do emprego abusivo e intimidatório de ações judiciais contra jornalistas e órgãos de imprensa. (…)
2. As ações postulam o reconhecimento da figura do assédio judicial, caracterizado pela propositura de diversas ações judiciais contra o mesmo jornalista ou veículo de comunicação, em diferentes comarcas, baseadas no mesmo fato, com propósito silenciador ou intimidador.
3. Constatado o assédio judicial, os pedidos formulados discutem as seguintes questões: (i) reunião de todas as ações num único foro, o do domicílio do réu; (ii) responsabilidade civil do jornalista [QUEM SOFREU O ASSÉDIO, não quem praticou] ou órgão de comunicação somente em caso de dolo ou culpa grave; (iii) penhora em dinheiro deixar de ser o mecanismo preferencial para satisfação de execução em face de jornalistas; (iv) dever de ressarcimento de danos materiais e morais ao réu vítima de assédio judicial; e (v) dever de ressarcimento de dano moral coletivo em razão da prática de assédio judicial a jornalistas. (…)
7. Reconhecimento da figura do assédio judicial a jornalistas. Procedência dos pedidos relativos aos subitens (i) e (ii) do item 3 acima, e improcedência dos demais, como explicitado a seguir. 8. A proteção da liberdade de expressão legitima a fixação de competência no foro do domicílio do réu, uma vez caracterizado o assédio judicial. Essa é a regra geral do direito brasileiro (CPC, art. 46) e diversas leis preveem expressamente a reunião de ações com os mesmos fundamentos em um único foro (Lei da Ação Popular, Lei da Ação Civil Pública, Lei de Improbidade Administrativa).
9. Da mesma forma, a posição preferencial da liberdade de expressão protege a atividade jornalística, somente devendo se dar a responsabilidade civil do jornalista ou do veículo de comunicação em caso de dolo ou culpa grave. (…)
Teses de julgamento: “1. Constitui assédio judicial comprometedor da liberdade de expressão o ajuizamento de inúmeras ações a respeito dos mesmos fatos, em comarcas diversas, com o intuito ou o efeito de constranger jornalista ou órgão de imprensa, dificultar sua defesa ou torná-la excessivamente onerosa. 2. Caracterizado o assédio judicial, a parte demandada poderá requerer a reunião de todas as ações no foro de seu domicílio.
3. A responsabilidade civil de jornalistas ou de órgãos de imprensa somente estará configurada em caso inequívoco de dolo ou de culpa grave (evidente negligência profissional na apuração dos fatos)”.
(ADI 6792, Relator(a): ROSA WEBER, Relator(a) p/ Acórdão: LUÍS ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 22-05-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 03-04-2025 PUBLIC 04-04-2025